Profissionais são contratadas por entidade social de Poá, na Grande São Paulo, para cuidar de crianças e adolescentes que perderam o cuidado parental. Decivalda Teodora Santos é mãe social há 20 anos
Decivalda Teodora Santos/Arquivo Pessoal
Trocar fraldas, acompanhar em consultas médicas, ajudar nas lições de casa, educar. Nas casas com crianças, esses são trabalhos que costumam ser feito sem remuneração, geralmente pelas mulheres. Já em uma entidade social de Poá, na Grande São Paulo, esta é a lista de tarefas de uma profissional contratada para ser “mãe social”.
Apesar da carteira de trabalho assinada, só de ter a palavra “mãe” no nome, já é possível saber que a profissão exige muito. Decivalda Teodora Santos conquistou esse emprego há 20 anos.
“Ser mãe social é um trabalho, como qualquer outro, mas precisa do dobro de dedicação. Não adianta ser só pelo salário porque, se for assim, não compensa. Você precisa querer ser alguém que faz a diferença para aquela pessoa que perdeu a família, não tem referências… É contribuir ao máximo com a vida dela”, conta.
Decivalda explica que cada família convive em uma casa-lar dentro da instituição Aldeias Infantis SOS, em Poá. As casas abrigam cerca de 10 crianças e cada mãe fica responsável por sua respectiva família. Crianças e adolescentes, meninos e meninas, todos convivem juntos. Vale lembrar que irmãos biológicos também são mantidos juntos.
“A relação é construída de forma natural, existem crianças que irão te aceitar bem e tem outras que não, mas é um processo de construção. Vocês precisam conviver juntos, como mãe e filho”, diz.
Decivalda diz que o amor que sente pelas crianças e adolescentes é igual ao de mãe
Decivalda Teodora Santos/Arquivo Pessoal
O projeto atende somente pessoas com menos de 18 anos. Entretanto, a mãe conta que o contato é mantido mesmo após o filho sair de casa. “Não nos despedimos porque mantemos o contato até hoje. É como se fossemos uma família mesmo. Uma hora os filhos crescem, tomam seu próprio rumo, mudam de casa e, mesmo assim, o contato é mantido. Hoje, com a facilidade das redes sociais, eu falo com os meus filhos todos os dias… É uma maravilha!”, celebra.
Decivalda não tem filhos biológicos, mas guarda no coração todos que já criou. O olhar de cuidado, os puxões de orelha, a luta para que eles cresçam e se desenvolvam bem, tudo foi essencial para que hoje, olhando parte dos filhos já adultos, o orgulho tome conta.
“Mãe, para mim, é todos os dias. Não tem essa de ‘Dia das Mães’. Todos os dias você precisa fazer a mesma coisa, sempre. Falar, pegar no pé, conversar, cuidar e amar. Todos os dias são nossos”.
Família que vai crescendo
Quem também atua no ramo é a Maria Divina Gonzaga da Costa, de 53 anos. A moradora de Mogi das Cruzes , na Grande São Paulo, é mãe social há 28 anos e conta que os laços estabelecidos com os adolescentes foram tão fortes que hoje é até avó. “Já ‘formei’ várias crianças e adolescentes e, o que mais me alegra, é quando eles vão embora e eu vejo que eles estão bem, casados, trabalhando… Eu mantenho contato com a maioria deles e eles vêm me visitar”, diz.
“Me dá muito orgulho de ver que, de alguma forma, a sementinha brotou. Todos são a minha família. Eles frequentam a minha casa, eu frequento a casa deles, os filhos deles me chamam até de ‘vó’ e, claro, eu sou sim a avó deles”, celebra.
Maria Divina Gonzaga da Costa brincando com as crianças
Maria Divina Gonzaga da Costa/Arquivo Pessoal
Maria conta que não tem filhos biológicos, mas tem uma filha adotiva, de 21 anos – que é uma criança que chegou na instituição com apenas 7 meses. A mãe conta que conviveu com ela na organização até os 8 anos e, depois disso, conseguiu a guarda legal da menina.
Para ela, ser mãe social é ter um olhar de carinho, afeto e respeito por aquela criança e aquele adolescente. “É como se eu fosse mãe do coração. Eu não gerei essas crianças, mas são meus filhos, que eu amo, que eu quero bem e batalho por eles, quero vê-los crescendo, amadurecendo e conquistando seu espaço no mundo”.
Organização da casa também é tarefa de uma mãe social
Maria Divina Gonzaga da Costa/Arquivo Pessoal
Sobre o projeto
Ao todo, a instituição Aldeias Infantis SOS conta com 152 mães sociais. O coordenador de Recursos Humanos da organização, Wanderley Marcondes, explica que o cargo é CLT, registrado na carteira de trabalho e com todos os direitos trabalhistas garantidos.
Os principais critérios para ser mãe social são:
ser solteira, viúva ou divorciada;
ter disponibilidade para morar nas casas lares do instituto;
atuar em horário é intermitente (com folga de 36h por semana).
“As candidatas passam por um processo seletivo rigoroso. Sendo aprovadas, elas passam por um período de formação com conteúdos teóricos e práticos sobre cuidados infantis. A candidata entra como mãe substituta, sempre acompanhada pela mãe social mais experiente, para que ela aprenda a lidar com a dinâmica da casa”, diz.
ONG Aldeias Infantis SOS tem como objetivo cuidar e proteger crianças e adolescentes que perderam o cuidado parental
Aldeias Infantis SOS/Divulgação
Durante o convívio na casa, os moradores passam por um Plano de Desenvolvimento Individual, já pensando na fase adulta dos atendidos pela ONG.
O jovem, ao completar 18 anos, pode retornar para algum familiar, ser adotado, dividir uma república ou morar sozinho. Vale lembrar que esse processo é acompanhado pela respectiva mãe social, que ajuda na escolha e até na montagem da casa.
“Dentre as várias histórias que marcaram a organização, o que mais me emociona é quando vejo mães que se tornaram avós. Elas cuidaram daquela criança ou adolescente, ele cresceu, saiu da organização, constituiu a própria família e, em datas comemorativas como Dia das Mães, ele traz a atual família para o instituto e passa o dia com a mãe social. É uma relação linda”, conclui.
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