Ministério Público denuncia pai que bateu carro contra poste na Mogi-Salesópolis por tentativa homicídio contra o filho


Segundo o MP, o denunciado não se conformava com o término do casamento e agiu desta forma para fazer a ex-companheira, mãe da criança, sofrer. A advogada e doutora em Direito Penal pela USP, Amanda Bessoni, acredita que o caso expõe uma situação de violência doméstica familiar. Homem é acusado de tentar matar filho por não aceitar fim de relacionamento
Uma mãe que denunciou que o ex-marido tentou matar o filho de 11 anos e se matar, após bater contra um poste na Rodovia Mogi-Salesópolis no dia 7 de junho, acredita que o motivo do crime seria a revolta do homem pelo fim de um relacionamento amoroso. O Ministério Público apresentou uma denúncia contra o pai por tentativa homicídio contra o filho.
A criança teve ferimentos graves e precisou de cirurgia. Já o pai, que foi preso e permaneceu no hospital sob escolta, também ficou internado.
Angústia, medo e indignação são os sentimentos que ficaram após o fim de um relacionamento para a mãe. Recentemente, ela percebeu uma mudança repentina no comportamento do ex-companheiro, que não aceitava o fim do relacionamento.
“Ele começou a mostrar esse lado dele a partir de uns cinco, seis anos para cá. Torturava meu psicológico, começou a ser muito agressivo com as palavras. Ultimamente, insuportável a situação dentro de casa com ele. Esse término já tem uns três anos, já. Mas estava prolongando, prolongando para ele ir embora de casa. Aí chegou um mês e pouco atrás e ele saiu de casa. Aí ele saiu, depois de uns cinco minutos querendo voltar para casa, reconstruir a família, mas aí não tem jeito, ‘Cê vai viver a sua vida, que eu vou viver a minha vida’”, disse a mãe da criança.
Carro se chocou contra um poste na rodovia Mogi-Salesópolis e deixou ferido tanto o pai como o filho
TV Diário/Reprodução
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O ex-marido dirigia o carro que bateu em um poste dia 7 de junho, na altura do km 63 da Rodovia Mogi-Salesópolis. Além dele, o filho de 11 anos, que é autista, também estava no carro. Os dois ficaram feridos, o garoto com mais gravidade e ele ainda continua internado.
A mulher apresenta provas que mostram que o acidente pode ter sido intencional. Uma delas é este áudio, que ela diz ter recebido do ex-marido no dia dos fatos, com uma despedida.
“Eu peço, meu pai, em nome de Jesus. Jesus, recolhe nós, recolhe nós. Recolhe nós. Eu te agradeço”. “Estou na praia de Itaguaré, onde eu deixo o carro. Se eu não voltar, você vem buscar o carro. Ele está lá. Fica com Deus, Deus te abençoe, e eu estou te deixando a casa, tô deixando o carro pra você. Só estou levando comigo o [nome da criança que não foi identificado]. Estou me entregando pra Deus, pra Jesus Cristo. Obrigado por tudo que você fez, me perdoa. Eu agradeço tudo que você fez pra mim nessa grande vida. Obrigado”, disse o suspeito no áudio.
“Era tranquilo, os dois se entendiam bem, brincavam bastante, interagiam muito bem os dois juntos. Até o momento do acontecido”, explicou a mãe sobre a relação de pai e filho.
Uma amiga da família, que também não vamos identificar, ficou preocupada e tentou ajuda quando soube do áudio. “No primeiro momento, na verdade, do vídeo, eu já me desesperei. Comecei a entrar em contato com o 19, passando as informações do carro da minha amiga: placa, modelo, cor, o RG do filho. A PM que me atendeu no 190 pediu as características do pai do menino”.
Ela ainda conta que eles frequentavam a mesma igreja, e percebeu numa palavra usada pelo homem no áudio a real intenção dele com o filho.
“Na religião protestante, evangélica ou crente, como muitos falam. A palavra recolher significa morrer, tirar a vida. Então, o que acontece, uma pessoa está em sofrimento, a gente pede: ‘Deus, recolhe, leva com o senhor’. No vídeo gravado, ele pede por três vezes para que Deus recolha ele e o filho. Foi a hora do maior desespero e foi esse vídeo que o delegado entendeu a intenção de matar o filho”, disse a amiga da mãe.
“Ele fez isso para tentar me atingir, que não aceitava o fim da separação da gente. Ele queria de todo jeito voltar para casa, viver uma vida junto”, contou a mãe da criança.
O Ministério Público de São Paulo ofereceu uma denúncia para que o suspeito responda por tentativa de homicídio, justificando que ele tentou tirar a própria vida e a do filho. O documento reforça que o denunciado não se conformava com o término do casamento e agiu desta forma com intuito de fazer a ex-companheira sofrer.
Depois de levar o filho à praia e enviar o áudio pra mãe, ele retornava pela Rodovia Mogi-Salesópolis, quando chocou o carro contra o poste. Para o MP, o maior impacto da batida foi justamente onde o garoto estava.
O documento ainda revela que o denunciado causou um perigo comum, já que a batida foi em via pública, com movimentação significativa de pessoas e veículos.
E também dificultou a defesa da vítima, que estava no banco do passageiro, não tinha controle e nem sequer chance de se defender. Ainda de acordo com o MP, o denunciado ainda planejou e pôs em prática o plano sozinho, contra o próprio filho.
“O processo acabou de virar um processo criminal. Estava na fase de investigação, agora o Ministério Público apresentou a denúncia, ou seja, virou um processo criminal. Então, o acusado está sendo acusado de tentativa de homicídio com agravantes, por tentativa de matar o próprio filho, com deficiência e menor de 14 anos”, explicou Manoella Bellucci, advogada da mãe.
O garoto estar vivo é um alívio para a mãe. No entanto, a preocupação continua.“Ele está hospitalizado. Está sofrendo muitas dores, está oscilando muito, com febre. Está em adaptação de medicação. Comida não está ficando muito bem no estômago dele, está passando mal, não está se alimentando muito bem e está aguardando para ser liberado para casa, mas não sei quando vai ser. Tem toda essa situação dele também”, finalizou a mãe do menino.
A produção do Diário TV apurou que o garoto passou por cirurgia na noite desta segunda-feira (19), no Hospital Luzia de Pinho Melo e a situação dele é estável nesse momento. O advogado do homem citado na reportagem disse que não houve dolo homicida, mas sim um acidente na direção de veículo automotor, o que será provado no decorrer do processo.
Medidas protetivas
O Tribunal de Justiça de São Paulo determinou a soltura do suspeito, atendendo aos argumentos apresentados pela Defensoria Pública de que ele tem 65 anos e é réu primário. Além disso, a Justiça também concedeu uma medida protetiva, para que o suspeito não chegue próximo ao filho.
Amanda Bessoni, advogada e doutora em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP), explica quais os direitos de pessoas que passem por uma situação parecida em relação à própria segurança e à segurança da família.
“O que nós temos aqui é um caso que explicita uma situação de violência doméstica familiar, tanto contra a mulher, possivelmente, quanto contra a criança. Nós temos atualmente a lei 14.344, que é de maio do ano passado, que é de 2022, que criou alguns mecanismos para a prevenção do enfrentamento da violência doméstica familiar, também pra crianças e adolescentes, o que já havia no contexto contra a mulher com a Lei Maria da Penha. Então, essa nova lei trouxe alguns mecanismos semelhantes pra proteger também a criança e o adolescente numa situação de violência doméstica familiar. E uma delas é a medida protetiva de urgência, que pode ser, principalmente, pedir o afastamento da vítima, não podendo se aproximar da vítima a partir de uma certa distância, também dos familiares, de testemunhas. Então, é uma medida importante pra garantir que não haja nenhuma reiteração ou tentativa de reiteração de uma conduta de violência”.
Segundo a advogada, as medidas protetivas devem garantir o afastamento dos agressores em relação às vítimas. Caso sejam descumpridas, a família ou a própria vítima deve denunciar a situação.
“Na prática, as medidas protetivas são informadas ao agressor e ele tem o dever de cumprir, sob pena de praticar um outro crime, que é o de descumprimento da medida protetiva de urgência. No descumprimento, pode haver prisão em flagrante. As pessoas que presenciam ou a própria vítima podem ligar pra polícia e denunciar o descumprimento da medida, e a pessoa, então, pode ser presa no momento por descumprir a medida protetiva. Tem algumas medidas que podem ser pedidas também no âmbito cível, da família, com relação à criança. Há outras medidas também, previstas na lei que ficou batizada no ano passado como a Lei Borel. E no caso da mulher, nós precisamos observar os mecanismos, as previsões da Lei da Maria da Penha. Não sei se nesse caso concreto, a mulher também pediu uma medida protetiva de urgência, mas é possível sim o afastamento do domicílio e outras medidas pra afastar esse agressor da família e tanto do exercício de poder”.
Para a advogada, o principal fator de combate à violência doméstica familiar é a denúncia, que deve ser comunicada o mais rápido possível às autoridades policiais e outros órgãos competentes.
“É necessário que todas as pessoas que tenham conhecimento, que presenciem alguma situação de violência doméstica familiar, informem as autoridades competentes. Temos o conselho tutelar, no caso da criança, que pode também tomar as medidas cabíveis, o Ministério Público. Nós temos também as autoridades policiais, é claro, e alguns por telefone. Temos o Disque 100, da Ouvidoria dos Direitos Humanos. Inclusive, a lei, batizada de Henry Borel, impõe o dever de qualquer pessoa que tenha o conhecimento ou presencie uma ação nesse sentido, praticada seja no local público, seja no local privado de uma violência doméstica familiar contra a criança ou adolescente, tenha esse dever de comunicar o serviço, seja o Disque 100, sejam as autoridades policiais, seja o Conselho Tutelar. Então, algo precisa ser feito. São essas as medidas necessárias”.
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