Moradoras de Mogi das Cruzes celebram casamento homoafetivo e refletem luta por direitos na comunidade LGBTQIAP+


Lei que reconheceu a união civil entre pessoas do mesmo gênero completou 10 anos. Quem atua pela causa afirma que muita coisa ainda precisa mudar. Resolução reconhece há 10 anos casamento homoafetivo
Foi em agosto do ano passado que Jéssica Bernardes Saada e Márcia Celine Rocha Saada, de Mogi das Cruzes, trocaram as alianças. O feito, que representa um marco de vida, é também um exemplo da luta na causa LGBTQIAP+. Em meio a preconceitos, essa comunidade conquista direitos, mas mostra que ainda há muito a ser feito.
“A gente tem que sair do armário para colocar os homofóbicos dentro. Sai e vamos colocar eles dentro, porque não é a gente que tem que ficar escondido. O mundo está aí pra todo mundo viver, ser feliz, ter igualdade”, desabafa Márcia.
O relacionamento entre pessoas do mesmo gênero só foi reconhecido com os mesmos direitos da união heteroafetiva em 2011. A conversão da união em casamento só passou a valer em 2013, por meio de uma resolução do Conselho Nacional de Justiça. Hoje, o ato pode ser realizado em qualquer cartório de registro de pessoas.
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Jéssica e Márcia não tiveram dúvida de que esse era o caminho que queriam seguir. Se conheceram em 2020, durante a pandemia, época em que a recomendação era ficar em casa e manter o distanciamento. Elas contam que foi com a ajuda de uma amiga em comum que se descobriram e encontraram o amor.
“Minha melhor amiga é casada com a irmã dela. A gente estava numa fase bem desapegada, ‘não quero relacionamento’, ‘pega e não se apega’. Ela ia para a Bahia por conta do trabalho dela e acabou desistindo com a gente se conhecendo e tudo mais. E aí a gente se envolveu”, relembra Jéssica.
“A primeira vez que a gente se viu foi instantâneo, paixão a primeira vista. Começamos a se conhecer mais. Com um mês ela foi morar comigo, a gente se mudou para outra cidade, ficamos um ano em Sorocaba e lá a gente consolidou nosso relacionamento”.
Com a união estável, o desejo de constituir uma família foi natural. O primeiro passo era oficializar a relação e o dia escolhido para o tão esperado ‘sim’ foi 28 de agosto de 2022. Ter a certidão de casamento nas mãos era motivo de orgulho.
“Só queria esfregar pro mundo a minha certidão: ‘aqui pessoal, eu sou casada, minha esposa’. Nos lugares, estabelecimentos, perguntam o grau de parentesco. É esposa. Eu não deixo de mencionar. É esposa, minha esposa, somos casadas e é muito gostosa a sensação de poder ser. Você se sente muito completa”, afirma Jéssica.
“Não foi fácil, enfrentamos bastante preconceito, bastante julgamento. As pessoas não têm empatia, as pessoas não entendem que nós podemos existir” completa.
Um momento que a Márcia sempre idealizou, mas admite que teve dúvida se realmente conseguiria vivê-lo. “Tem gente que [deixa de se casar] por conta da família também. As vezes, agora que pode casar, mas por receio da família, de todo mundo, acaba não casando”, reflete Márcia.
Jéssica e Márcia se casaram em agosto do ano passado
Reprodução/TV Diário
A decisão do casamento veio acompanhada de um motivo especial. É que o pequeno Joaquim, fruto do relacionamento, estava prestes a nascer e poderia ser registrado com o nome das duas mães. Infelizmente, o bebê nasceu com uma cardiopatia congênita e acabou morrendo dois meses depois do parto.
Dentro de todo esse cenário, elas ainda tiveram que lidar com os entraves da burocracia que não aceitava o nome de Jéssica na certidão de nascimento. “Não consideraram nossa certidão de nascimento, não consideraram nosso casamento. Quem teve que registrar meu bebê foi a minha mãe”.
“Depois, que o neném veio a óbito, a gente conseguiu colocar o nome na certidão de óbito. De nascimento foi, mas só depois que ele faleceu”. A rápida passagem do filho agora é relembrada na tatuagem, compartilhada por Jéssica e Márcia.
Luta constante
Vinda de outra geração, a Alexandra Braga tem um relacionamento com Alex Schiszler das Chagas há 24 anos. Ela é uma mulher transexual, enquanto ele é homem cisgênero. Pela lei, são considerados om casal hétero e poderiam se casar dessa forma, mas ainda não deram esse passo.
Em mais de duas décadas lutando nesta causa, viram de perto a luta de amigos pra conseguir o direito ao casamento. “A gente escuta falar dos LGBT que eles querem direitos. Eles não querem direitos a mais. Eles apenas querem um direito que está sendo tirado. Essa lei que deu condição do casamento homoafetivo, ela trouxa uma série de coisas que davam a condição de crescer”, pontua Alex.
“É de suma importância, quando nós conseguimos essa lei da união homoafetiva, que trouxe para essa população o direito de estar com seu companheiro. Quando não mais, ter seus direitos garantidos assim como da pessoa heterossexual”, ressalta Alexandra.
Presidente do Fórum LGBT Mogiano, Alexandra ainda diz que como um todo, muito precisa mudar para que a comunidade seja, de fato, incluída.
“Nós não terminamos essa luta. O fundamentalismo, o conservadorismo, ainda insiste em não colocar essas pessoas no direito de família. É por isso que hoje nós trabalhamos o ‘dia da família’. Nós entendemos todas as formas de família. Essa característica de família homoafetiva tem que ter seu lugar e seus direitos reconhecidos. Deveres também”.
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